• Minha Poética

    Algo de mim, de Luiz Bucalon

    (Arte/imagem: Revista Lambari, Bagé-RS)

    Sou uma vida esquecida
    num ouvido surdo de lembranças
    e o poema
    o poema é feito de silêncios…

    Vivo à beira do desconhecido
    bem ao vértice
    onde o sonho perpassa o sono
    e afasto minhas roupas
    a entrever a eternidade…

    Parte de mim é esquecida
    outra parte desconhecida
    e quando sinto o belo ao olho
    de minhas dores brotam flores…

    Entro em teu quarto e sinto horas indo embora
    pois vivi a esperar-te e meu coração era só teus passos…

    Luiz Bucalon

                                  
  • Minha Poética

    Em círculo

    Uns voltam pra casa
    outros tomam outro caminho
    e outros dão a volta por longe
    e ainda outros… nunca mais…

    Até ontem morei aqui
    Antes de mim outro morou
    E antes dele outro também
    Hoje não moro mais em lugar nenhum
    Me perdi no voltar sempre pelo caminho mais distante.

    luizbucalon

  • Minha Poética

    Noite com lobos

    Os lobos batem à porta
    e este terror asfixiante
    na vaga escuridão

    o açoite da noite
    por causa da solidão
    é como aranha no caule
    tecendo a linha da vida
    e um palco de teias

    bem ali onde o doce é amargo
    a seiva desce indecentemente
    pelas veias estagnadas de dias

    meu rosto colorido dolorido
    tão cheios de vincos
    e sonhos de vinhos

    ajoelho-me sobre pedras
    debaixo de ventos e sóis
    onde palmeiras ventilam
    destilando serenatas
    em mundos acordados
    na incoerência das eras.

  • Minha Poética

    Estranho

    Eu falo dormindo quando tenho pesadelos
    arrumo briga numa casa vazia
    Eu sou desse tipo
    Daqueles que fogem de si
    Que entram nos outros
    Por baixo de pontes e casas abandonadas.

    Não sou ninguém
    Risquei meu nome
    Agora tenho vários
    Nomes pintados em muros rebeldes
    Em chapéus amassados
    Em perfumes vencidos
    Rasguei os documentos
    Agora sou o que sou, creia-me você ou não
    Eu sou livre
    Eu sou o que digo que sou
    Mas você não me reconhece quando digo o que sou

    Não, não me levem pra casa
    Não preciso ser carregado
    Deixe que o dia se apague
    Minha boca se babe
    Que a noite seja eterna
    E o gosto fugaz.

    luizbucalon

  • Minha Poética

    Cadê o meu rosto?

    Esse não é o meu rosto
    Cadê o meu rosto?
    O meu rosto era aquele que as mulheres tocavam com gentileza nas noites perdidas no tempo da memória
    Sim, há dois tempos: o do relógio quebrado e o da memória
    Um, o tic pra frente
    O outro, o tac pra trás.


    lcbucalon

  • Minha Poética

    Lembrar

    A lembrança é uma doença degenerativa A lembrança mata as pessoasAs más lembranças referem as feridas que pareciam fechadasE as boas… as boas machucam pela distância.

    lcbucalon